O Brasil suportaria transparência?

Gustavo Montoia

Uma vida de sueco assustaria os brasileiros. Já escrevi sobre isso. Certa deputada, que ganhou uma bolsa de marca muito cara de presente, foi criticada pela imprensa, por políticos e pela população: “como uma representante do povo ostenta uma bolsa dessa? ” O constrangimento levou à sua venda        e doação do dinheiro.

E-mails emitidos por parlamentares, documentos, registros de ações governamentais são de fácil acesso à população. E, se um político gasta dinheiro com táxi, no lugar de usar metrô, é questionado por órgãos reguladores do país. São muitos exemplos listados pela jornalista Cláudia Wallin, em sua obra “Um país sem excelências e mordomias” que causariam muito desconforto na realidade brasileira.

Transparência no Brasil é tema de avanços e retrocessos. E, na esteira de dados informados em portais, com orçamentos sempre milionários, na ponta, onde, de fato é que deveríamos enxergar, não há claridade. Isto é, se você olhar informações públicas em páginas oficiais sobre obras realizadas, poderá ter dificuldade de percebê-la no local de seu acontecimento. Essa mangueira furada não é trocada, de um governo a outro, desde obras do PAC ao famigerado sigilo de 100 anos para qualquer coisa.

Dos altos escalões do governo, isso também se reflete em fiscais que fazem “vistas grossas” ou são ameaçados se emitirem relatórios sobre a situação de barreiras de mineração, as condições de higiene de um frigorífico, a salubridade em ambientes de trabalho ou ao fim dado sobre materiais desperdiçados.

A iniciativa privada também se comprometeria, pois, a competitividade e os resultados que exigem de trabalhadores vêm de horas-extras não pagas, sacrifícios a base de Rivotril e Omeprazol, além de férias e FGTS arbitrariamente negados. Aqueles que se encaixam nesses exemplos, muitos defendem, ironicamente, essas “reduções” de “carga tributária” para gerar “mais empregos”. Assistimos, nos últimos anos, dívidas milionárias sendo perdoadas pelos governos, com o discurso dos altos custos da previdência, mas nenhum discurso sobre inadimplência.

Da mesma maneira, falta transparência na Saúde, privada ou pública. Assistimos negligência médica ocorrer e a vida das pessoas serem afetadas sem a menor reparação. E os laudos, a desejar, contribuem para que ninguém seja punido, salvo quando a instituição sacrifica indivíduos para se safar de suas responsabilidades.

Nos apropriamos de forma individual de coisas públicas, e no erário público, emprega-se família, obtém-se carros e roupas de alto valor, gasta-se sem preocupação com algo que não será descontado do salário. Produtos e artigos de baixa qualidade são vendidos por licitação ao Poder Público, custando o “olho da cara”, e fico me perguntando se gostaríamos mesmo de dar satisfação de nossas ações enquanto agentes sociais, ou se a desculpa seria que isso gastaria tempo e aumentaria a burocracia.

Falta transparência, no discurso e na prática e sobra muita justificativa para os erros e pouco interesse na coisa pública. Como cortina de fumaça, é polarização que alimenta a militância, que parece defender uma seita que para tudo existe explicação, reconsideração, em um velho maniqueísmo. Todos são ditadores de suas ideias e alimenta seu monstro particular.

O que precisamos é de refrigeração nas posições políticas que adotamos e isso ocorrerá quando todas as luzes forem acesas, admitir sombras, estabelecer redes e cumprir deveres. Reformar nossa sociedade, vem, desde um pragmatismo político, com ações que sejam boas para todos sem medo de “favorecer” o adversário político, ao cumprimento de nosso trabalho como agente social, até mesmo em não aceitar o troco errado da padaria. É abolir a ideia de obter vantagem para realmente viver a cidadania.

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