Saudades do Fernando Henrique Cardoso, governo de centro-direita, tal como se apresentara na época, e como a minha geração aprendeu, com professores e leituras, a ser crítico politicamente. Nas aulas de sexta-feira com nosso professor de Geografia, minha turma de ensino médio trazia o resumo da semana, com fatos, projetos de lei e propostas para o país. Apesar das críticas que desenvolvíamos, da divergência de ideias, todos aprendemos a respeitar as opiniões e o desejo pelas melhorias que o país necessitava, superava os interesses ideológicos de Direita ou Esquerda naquela sala de aula.
Hoje, uma nova Direita política se apresenta mais intolerante, até mesmo por partidos mais tradicionais, diferente daquele mundo da década de 1990 e anos 2000. Nestas eleições municipais, tendo conquistado mais municípios brasileiros que os partidos de esquerda, além de reafirmar um país que sempre pendeu mais para este espectro político, como afirma a cientista política Maria Hermínia Tavares, também se configura com roupagens do bolsonarismo e dos aspectos de uma extrema direita que vem para intimidar.
Candidatos a prefeito não apenas pelo PL, atual partido de Jair Bolsonaro, mas do PSD, Republicanos, e até mesmo MDB apresentaram-se como ideários da Direita, do liberalismo econômico e do conservadorismo. Até aí, nada de diferente. O que vem destoando esse espectro da realidade que estávamos acostumados, são os elementos personalistas com Bolsonaro, no saudosismo do passado autoritário, na negação aos métodos e à Ciência.
Vejam: primeiro, não se constrangem em estar ao lado da figura do Bolsonaro, tão controverso e que nunca foi antissistema, embora haja insistência nesse discurso. De suas falas descabidas e suas posturas questionáveis, nem sequer ousam criticá-lo. Não é Direita. É bolsonarismo.
Um segundo elemento é que não ousam condenar nosso passado autoritário. A Ditadura Militar não é refutada sem o menor constrangimento. Esse período do nosso país é visto como uma época de eficiência e transparência, algo totalmente contrário aos fatos. Como admitir estar em uma democracia e não condenar esse passado?
Ainda nesse pensamento, os mesmos que afirmam, após a vitória eleitoral, que foi “a festa da democracia”, defendem que o voto impresso é melhor. A ironia é que não é desconhecimento deles, a história do nosso país que envolve o voto na cédula de papel com fraudes, títulos de eleitor de pessoas mortas usados em eleições, contagem de votos enquanto algumas cédulas eram rasgadas e por aí vai.
Quem não entende desses fatos nega a metodologia e o rigor que envolve a urna eletrônica. Existe uma ode à ignorância em se recusar a entender o processo. Este ano tive a infelicidade em escutar de um jovem em formação que “é claro que ele faria uma urna capaz de ser corrompida se alguém o pagasse e, por isso, ele não acredita em sua veracidade”. É uma triste maneira de medir a nossa política pelos estereótipos construídos ao longo dos anos e que servem para afastar cada vez mais o povo dos processos decisórios.
Um último exemplo, existe o orgulho em afirmar que ninguém é obrigado a se vacinar ou vacinar seus filhos. É a alimentação de um extremo individualismo anticientífico ao olhar com bons olhos um presidente que se orgulhou por não ter se vacinado em plena pandemia. É essa Direita que vai permanecer? Com ideias políticas que rejeitam pactos sociais que são coletivos, quando deveriam ser incentivados, em prol da sociedade e do histórico exemplo brasileiro em cobertura vacinal.
Em uma democracia, ideias divergentes existem sobre como um país deve buscar crescimento e desenvolvimento. É parte do processo. Direita e Esquerda, Progressistas e Conservadores são parte dessa arena quando um lado oferece contrapeso ao outro. Todavia, existem limites e bom senso ao respeito pelos adversários, à reverência pelo regime, ao patamar daquilo que é civilizatório. Era sobre isso que minha turma aprendia naquela sala de aula. Era sobre o “eu que se construía com o outro”, era sobre um país, como aquele em que assistimos o FHC entregar a faixa ao Lula em sua primeira eleição, ainda que tenha sido por ele, duramente criticado pelo seu programa de privatizações, mas, que ainda assim, pela democracia, facilitou a transição do governo.
Pobre Direita é essa que tenta se apresentar. Aumenta as minhas saudades daquelas sextas-feiras em sala de aula.
Gustavo Montoia é geógrafo e doutor em Planejamento Urbano e Regional pela UNIVAP. É docente dos Colégios Univap e da EE Francisco Feliciano F. da Silva (Verdinho) e pesquisador-colaborador do Laboratório de Estudos das Cidades da Universidade do Vale do Paraíba. @semanariojornal
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