CONHECENDO A HISTÓRIA

QUANDO AS CASAS RECEBERAM NÚMEROS E AS RUAS NOMES

Benedicto Sérgio Lencioni

Num artigo anterior (Aformosear da Cidade) comentei que a cidade, a partir de 1887 começou a ganhar forma; aformoseando-se, como graciosamente disseram os vereadores pela colocação de guias e calçadas. Ganhava visualmente um novo aspecto urbano. O pedestre ganhou seu espaço, enquanto a carroça e o animal a rua. Foi um grande avanço disciplinando-se o que hoje chamamos de “mobilidade urbana”.

Houve um tempo, em que os animais que iam para o abate no Matadouro que ficava ao lado do Rio Paraíba, eram encaminhados soltos pelas ruas que passaram a ser chamadas de “caminho do gado”. Pitoresco espetáculo de cavaleiros vestidos a caráter, guiando os animais pelo trajeto.

Na sessão da Câmara do dia 4 de novembro de 1890, nos primórdios da República, o membro da Intendência Constâncio da Silva reclamou da necessidade de numerar as casas e denominar as ruas. Até então não havia placas e as pessoas iam à casa do senhor tal, ou da viúva. As pessoas se conheciam e por elas se conheciam as ruas.

A rua que ia para a Igreja do Carmo era a rua do Carmo, que se avistava do Largo do Bom Sucesso, lá no fim da rua, que era o caminho para Santa Branca, subindo o morro do Parque Santo Antônio em direção ao Jardim Colônia.  A rua do Pastinho, que ficava entre o Largo da Estação e o Mercado Municipal, hoje Dr. Lúcio Malta. Era no pastinho, uma área municipal onde se recolhia os animais soltos e os dos viajantes que iam para outras plagas.  Naqueles tempos os fazendeiros mais abastados moravam na roça e vinham nos finais de semana para as “casas da cidade” ou palacetes, conforme a expressão econômica de seus recursos.

Naquela sessão da Câmara de 4 de novembro, o intendente Constâncio da Silva indicou que se numerassem as casas e denominassem as ruas. As ruas deixariam de ser a do Carmo, a do Pastinho, das Flores, Direita, Nova, do Mercado, da Quitanda, da Forca, do Meio, do Cubatão, da Cadeia… Aos poucos os nomes foram surgindo.  Jobanito enriqueceu as folhas deste “Semanário” que editou no saboroso livro “Pelas Ruas da Cidade” uma parte de suas valiosas crônicas.

O intendente queria homenagear as pessoas que haviam contribuído para o progresso da cidade. Constâncio indicou que se denominasse a rua do Carmo de Cônego José Bento de Andrade. Ao aprovar a ata pediu que mudasse para a rua do Meio (hoje Rui Barbosa). Na sessão do dia 18 de novembro do mesmo ano, o Presidente declarou que na ata anterior deveria ter constado que a Rua do Mercado seria chamada Rua Dr. Lúcio Malta e que a Rua do Cônego José Bento não é a rua do Carmo, mas sim a rua do Meio (hoje Rui Barbosa), mas acabou sendo a rua que ia do muro da estrada de ferro até o alto do morro.

Quis homenagear também o Barão de Jacareí e foi lembrado na ocasião, que já existia uma rua com o nome Licínio Lopes Chaves que era, afinal, o Barão de Jacareí. Houve apenas a troca do nome para o título honorífico – Barão. Sugeriu ainda que a Rua do Pastinho que já era conhecida como rua do Mercado, recebesse o nome de rua Dr. Lúcio Malta, o que permanece até os nossos dias.

Nessa sessão o senhor João B. de Souza propôs fazer “o emplacamento da cidade em chapas de zinco ou flandres determinando os números, a 300 réis cada uma e os letreiros de denominação das ruas a 1,500 réis, e os becos a 1,00.” Para cobrir essas despesas a Câmara criou um imposto provisório de 400 réis para a numeração do prédio, consultando antes o Governador do Estado sobre o imposto a ser cobrado. Resolveu, porém, abrir uma licitação para os serviços mediante edital.

Hoje os meios eletrônicos tornaram obsoleta a procura e situação das ruas de uma cidade, e até de casas, podendo inclusive ver-se a fachada do imóvel. Tudo acabou, perdendo a parte da procura nos guias de relações dos nomes das ruas e mapas de localização, que se editavam todos os anos. O GPS no celular reduziu tudo num simples toque. Acabou a graça!

Benedicto Sérgio Lencioni é professor, historiador, advogado, pintor, escritor e político de Jacareí. Escreveu diversos livros sobre a história da cidade. Foi vereador por duas legislaturas e posteriormente também foi prefeito por dois mandados.

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