Um estudo publicado, em 2023, na Neurology, revista médica da Academia Americana de Neurologia, com 8.896 idosos (média de 73 anos), revelou que aqueles com menor interação social apresentaram volume cerebral total cerca de 67,3% do volume intracraniano, contra 67,8% dos mais socialmente ativos.
Para a especialista em neurociência e diretora da BrainEstar, Emily Pires, esses dados não são desconhecidos e ela explica como o isolamento afeta o cérebro: “O isolamento social impacta diretamente regiões como o hipocampo (relacionado à memória e ao aprendizado), o córtex pré-frontal (responsável por funções executivas como atenção, tomada de decisão e controle emocional) e a amígdala, que regula respostas emocionais. A falta de conexão social leva a um estado de estresse crônico que afeta a neuroplasticidade e reduz o volume dessas áreas, comprometendo funções cognitivas importantes”.
Mas não é apenas o isolamento social entre os idosos que têm preocupado os estudiosos da área, há também uma espécie de isolamento bem comum nos dias de hoje, que afeta jovens e adultos, o isolamento social digital.
Uma pesquisa da Baylor University, publicada em 2024, com quase 7.000 adultos na Holanda ao longo de 9 anos, revelou que tanto o usopassivo (rolagem) quanto o ativo (postagens/interações) de redes sociais estão ligados a aumento de solidão ao longo do tempo. Considerando que a solidão é um dos fatores que levam ao isolamento, isso pode resultar em distúrbios cerebrais.
De acordo com um levantamento da Eletronics Hub (2023), o Brasil é um dos países em que se passa o maior tempo utilizando smartphones, telas e dispositivos eletrônicos, em média 9h diárias de uso, perdendo em tempo apenas para as Filipinas.
“O uso excessivo de telas, especialmente de forma passiva (scroll infinito, consumo de conteúdo sem interação real), reduz a estimulação de áreas como o córtex pré-frontal e prejudica habilidades
como empatia, foco, linguagem e memória de trabalho. Quando isso se soma ao isolamento, o cérebro é privado tanto da interação humana quanto de experiências ricas do mundo real, o que resulta em maior risco de atrofia funcional e desregulação emocional”, explica Emily.
No caso dos idosos, a neurocientista explica que a interação social funciona como um “exercício” para o cérebro. “Quando deixamos de estimular esse circuito, principalmente em idades mais avançadas, aumentamos o risco de acúmulo de proteínas tóxicas associadas a doenças como Alzheimer. A solidão crônica está ligada ao aumento de inflamações sistêmicas e à diminuição da conectividade cerebral, dois fatores que aceleram o declínio cognitivo e a vulnerabilidade a doenças neurodegenerativas”.
Já entre as crianças e jovens, a Sociedade Brasileira de Pediatria (SBP) identificou vários problemas associados ao uso excessivo de telas, incluindo distúrbios mentais, como ansiedade, transtorno do déficit de atenção, hiperatividade, dependência digital, entre outros. Os resultados foram publicados no manual “Menos Telas + Saúde” (2024), onde é feita a recomendação do tempo de tela para cada faixa etária, inclusive sugerindo alguns limites para os maiores de 18 anos também.
Em todos os grupos, a interação social é o caminho óbvio. Emily explica que o contato social estimula a liberação de neurotransmissores como oxitocina, dopamina e serotonina, que promovem sensação de bem-estar, segurança e vínculos afetivos. Além disso, ele ativa redes neurais complexas que envolvem empatia, linguagem, memória e planejamento. “Socializar é uma das formas mais completas de treinar o cérebro — tanto cognitivamente quanto emocionalmente”.
Crianças e idosos são naturalmente os grupos mais vulneráveis, mas soma-se a eles outros perfis. “Os idosos enfrentam um declínio natural da reserva cognitiva. Já pessoas com histórico de depressão, ansiedade ou TDAH tendem a ter redes neurais mais sensíveis ao estresse e à desconexão social, o que agrava quadros já existentes. Crianças e adolescentes também merecem atenção, pois estão em fase de desenvolvimento de habilidades sociais e emocionais fundamentais”, explica Emily.
Se o isolamento social parece ser uma premissa dos tempos atuais, de hiper conectividade e enfraquecimento dos relacionamentos humanos, o seu impacto no cérebro ainda pode ser revertido, com a mudança de hábitos ou com terapias direcionadas para esta função.
“O cérebro tem capacidade de recuperação — especialmente se a estimulação ocorrer de forma contínua e estratégica. Estímulos como atividades em grupo, terapia, exercícios cognitivos, prática de esportes coletivos, voluntariado e reintegração social ajudam muito. O neurofeedback, nesse contexto, é uma excelente ferramenta, pois atua diretamente na autorregulação cerebral e no fortalecimento de redes neurais ligadas à atenção, estabilidade emocional e plasticidade cerebral — acelerando a recuperação dos efeitos do isolamento” explicou a neurocientista.
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