Não queria ser testemunha desse tempo infame, juro que não. Mas ouvi quando uma criança gritava enquanto Putin bombardeou a Ucrânia. Alguém, mãe ou pai, filmou e gritou também.
E, depois, pude observar o desalento das mulheres e seus filhos pequenos a atravessar a fronteira daquele país com a Polônia. E de lá, talvez, abrigarem-se na Alemanha que agora não tem Merkel.
E assisti também aos protestos dos russos em Moscou contra Putin.
Eu não queria escrever isso, mas me invadiu um medo de que o Bolsonaro tenha ido lá oferecer apoio e soldados de sangue jovem e nenhuma experiência, que triste se isso tiver uma pequena fresta de verdade.
Enquanto estou escrevendo, são 20 horas por lá, que triste, que triste. Bombardeios, incêndios e pessoas desalentadas.
Não falo em mortes, não conto as tragédias que alcançaram os soldados russos, que os tiraram de casa no inverno e os afastaram da família para servir a um governo cruel que perdura demasiadamente. E nem dos ucranianos com armas incomparáveis às dos russos.
Também não gostaria de escrever que começou nesta madrugada uma guerra que pode ser a terceira e que não bastasse a pandemia, Putin se arroga em anjo exterminador, coloca seu exército sobre a neve e invade um território estratégico.
Olhei aquelas mulheres passando pela fronteira com a Polônia. Sei que muitas delas levarão no bolso do casaco de lã as chaves de suas casas. Na esperança profunda de voltar, farão como as mulheres de todo o mundo quando são coagidas e têm que abandonar o que é seu e de sua família.
Que voltem com suas crianças, que abram de novo a porta de suas casas, que desapareça em Putin o desejo de poder, poder, poder.
O que você, que me lê, faria se tivesse que sair às pressas? O que levaria de fotos de família, roupas, documentos?
Muitas casas ficaram para trás. Uma criança deixou uma tarefa pela metade, um livro aberto permaneceu sobre a mesa. Uma planta secará quem lhe dará água.
E o resto são casas vazias, bombardeios, tragédias, governos vis e sordidez humana.